Mostrando postagens com marcador sentimentos. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador sentimentos. Mostrar todas as postagens

sábado, 15 de agosto de 2020

Desconforto e narrativas

Acredito que, na vida, quem vive bem é quem sabe lidar bem e gerenciar os próprios desconfortos.

Primeiramente, o que quero dizer com desconforto? A ideia aqui é utilizar a palavra desconforto em um sentido mais amplo. Há desconfortos que eu chamaria de físicos, como dor, calor, frio, fome, sono. E desconfortos que eu chamaria de psicológicos/emocionais, como tristeza, raiva, saudade, solidão, ansiedade.

Viver, por si só, equivale a sentir desconfortos. Falando sobre isso com minha psicóloga, ela levantou a idéia de que os desconfortos estão relacionados às nossas necessidades.

Lidar bem com os nossos desconfortos estaria relacionado a como lidamos com as nossas necessidades. O grande problema é que, muitas vezes, temos necessidades conflitantes. Assim como temos necessidade de descansar quando estamos com sono, temos necessidade de preparar comida e nos alimentar quando estamos com fome. Mas e sentimos os dois?

Já em um nível de abstração maior, minha namorada, a Carol, disse que a ferramenta que usamos para lidar com os desconfortos é a narrativa. As narrativas que criamos diante das nossas necessidades e desconfortos permitem que lidemos com elas de maneira positiva ou negativa. E eu concordo.

Por exemplo, se alguém nos promete alguma coisa e não cumpre, podemos adotar a narrativa de que a pessoa falhou e, portanto, a raiva que sentimos em relação a ela é legítima. Ou podemos adotar a narrativa de que ela teve algum problema e não conseguiu ou que já deveríamos esperar isso das pessoas porque elas são falhas. O sentimento de frustração talvez seja o mesmo, mas a forma como lidamos com ele através da narrativa muda.

Isso implica que as narrativas que criamos teriam muito mais importância sobre nossas vidas do que a maioria das pessoas entende ou consegue perceber. Por isso, é interessante que prestemos mais atenção nas narrativas que criamos. Isso permitiria que tomássemos mais controle sobre elas, sobre a forma como nos sentimos, sobre nossas vidas e, por consequência, que vivêssemos melhor.

domingo, 11 de março de 2018

Meditação e aceitação

Há algum tempo eu era obcecado com a ideia de aceitação. E, de certa forma, é o que todo mundo diz.
"Aceite mais o seu corpo."
"Não dá pra mudar o passado, resta aceitar."
"O que não se controla, aceita-se."
"As pessoas são imperfeitas, tem defeitos. As pessoas erram. Cabe a nós aceitá-las como são."

Acho que eu realmente acreditava nesse tipo de coisa. Mas, sabe, aceitação é como aquele remédio ruim que você toma. Você toma porque acredita que ele vai te fazer melhor, mas a experiência não é agradável e deixa um gosto amargo na boca.

Ultimamente tenho criado o hábito de meditar. Tenho meditado todos os dias ou quase. E tem sido muito interessante. Meditar não significa não pensar em nada. Meditar não significa controlar seus pensamentos. Pensamentos vêm e vão e, na maioria das vezes, sem o nosso controle. Meditar te ensina a deixar os pensamentos fluírem de uma forma mais livre. Te ensina a não necessariamente ter uma resposta emocional quando os pensamentos vem, nem positiva e nem negativa. Te ensina a dissociar pensamento de sentimento e criar mais equilíbrio. Te ensina a julgar menos aquilo que vem à cabeça.

Voltando à questão da aceitação. O fato de aceitar nos coloca em uma posição julgadora.
"Eu julguei a situação passada como ruim. Estou tentando aceitá-la."
Aceitar o que é bom é fácil, é automático. Quando se fala em aceitar, refere-se às coisas ruins. E, por mais que se aceite, o gosto amargo no fundo da boca permanece. E, nisso, a meditação pode ajudar. A meditação ajuda a te tirar dessa posição julgadora, de ficar avaliando coisas como boas ou ruins. E isso te liberta.

Por fim, quando julgamos algo, nos colocamos na posição de juiz. Julgando alguma coisa como ruim e dizendo "eu aceito isso", nos colocamos acima do mundo. Nos colocamos como centro do universo. Colocamos nosso valores como superiores. Alimentamos nosso ego. Alimentamos nosso viés e nossos preconceitos.

sábado, 10 de março de 2018

O problema da paixão

Paixão... Paixão é aquilo que foge do racional. Paixão é aquilo que acontece quando nossos olhos brilham por alguém. É quando vemos o extraordinário no ordinário. É quando o coração bate mais rápido e mais forte. É quando enxergamos beleza naquilo que é comum.

Mas tem uma coisa engraçada sobre a paixão. Muita gente já deve ter passado por uma situação dessas... Sabe quando você conhece alguém e você pensa: "Nossa, essa pessoa super combina comigo, a gente daria super certo juntos. Ela é uma companhia agradável e gosto dela, mas acontece que não me apaixonei por ela"? Ou, às vezes, você conhece uma pessoa que não tem nada a ver contigo e, mesmo assim, você se apaixona por essa pessoa, sabendo que dará errado.

A paixão parece algo quase mágico. Coisa que viola o nosso livre-arbítrio de escolher por quem a gente deveria ou quer se apaixonar e com quem se relacionar. É uma coisa meio impositiva que recai sobre a gente. A razão manda uma coisa, a paixão quer outra.

Mas, afinal de contas, o que faz despertar nossa paixão? Até que ponto temos o poder e o direito de escolher por quem nos apaixonamos?

quinta-feira, 9 de novembro de 2017

Tristeza e raiva

- O quê...
- Apenas escute. É uma história de um homem velho prestes a morrer. O ódio é o lugar para onde vai um homem que não consegue suportar a tristeza. A vingança é mais escura que mancha de sangue. A tristeza é uma adaga afiada para acertar seu coração. Com o passar dos dias, apenas fica mais afiada. A única coisa que resta é o seu poder.
- Ei, ei... Isso não parece com você. Você vai me dar sermão?
- Sua maneira de viver também não é ruim. Mas eu vejo um corte no seu coração. O medo deixou uma rachadura nele.

Berserk é uma das minhas histórias favoritas. Em geral, acho que a força da narrativa mostra-se mais pelos acontecimentos e atitudes dos personagens do que pelos diálogos em si. No entanto, essa cena em particular, entre Guts e Godot, me chamou a atenção.

"O ódio é o lugar para onde vai um homem que não consegue suportar a tristeza."

Tristeza e raiva são faces da mesma moeda. Em qualquer situação em que você sente raiva, seria possível sentir tristeza no lugar. A raiva surge do inconformismo, surge quando acreditamos que o motivo de nossa tristeza ou frustração poderia não existir. A tristeza é a raiva conformada. E é o que sobra quando deixamos a raiva de lado. E, quando deixamos a tristeza de lado, o que sobra é a resignação.

O homem que não sente raiva não é o homem impassível, sem sentimentos. O homem que não sente raiva é o que sabe lidar bem com as situações de tristeza. É o homem que sabe que não possível mudar o passado. É o homem sábio.

segunda-feira, 6 de novembro de 2017

Duke Ellington e Trapaça

Não sou uma pessoa com grandes ilusões na vida, nem grandes ambições e desejos. Acho que a única ilusão que verdadeiramente mexe comigo é a do amor romântico. E é uma coisa que tenho tentado trabalhar mais comigo mesmo, para ser menos iludido. Em particular, existe uma fantasia que povoa meus pensamentos.

Há uma cena no filme Trapaça, acerca de Duke Ellington, um artista de jazz famoso, na qual os protagonistas Irving e Sydney se conhecem.

No meio de uma festa, Irving e Sydney se avistam. Ela estica o braço para alcançar um petisco. Ele segura seu braço e pergunta:
- É o Duke Ellington no seu bracelete?
Sydney:
- De fato, é sim. Ele morreu neste ano, você sabe...
Irving:
- Eu sei, duvido que alguma outra pessoa aqui saiba ou se importe com isso.
Sydney:
- Bem, eu me importo. Ele salvou minha vida muitas vezes.
Irving:
- A minha também. Qual delas?
Sydney:
- Jeep's Blues.
Irving:
- Você quer escutar?
Sydney:
- Agora?
Irving:
- Sim.
Sydney:
- Claro.
Então, eles seguem para uma sala mais reservada para escutar Jeep's Blues.
Irving:
- Quem começa uma música dessa maneira?
Sydney:
- É mágica.
Irving concorda:
- É mágica.
Sydney analisa Irving:
"Ele não estava necessariamente em forma, e ele tinha esse penteado que era todo elaborado. Ele tinha essa aura em torno dele. E ele tinha essa autoconfiança que me atraiu. Ele sabia quem era. Ele não se importava."
Irving:
"Como eu, ela era uma pessoa bastante peculiar. Como eu, ela veio de um lugar em que suas opções eram limitadas."
Sydney:
"Na verdade, pode ser meio sexy algumas vezes. Há uma ousadia nisso tudo. Mas aonde essa ousadia me levaria? Eu não sabia, mas eu iria descobrir."



Na continuação da cena, Irving prossegue:
"Ela era diferente de todo mundo que já conheci. Ela era inteligente. Ela via através das pessoas nas situações. E ela sabia viver com paixão e estilo. Ela entendia Duke Ellington."

De alguma maneira, eu ainda espero encontrar a pessoa que entenda Duke Ellington na minha vida. Acho que entender Duke Ellington é uma metáfora excepcional. Pode ser muito mais amplo do que é descrito no filme, mas, ainda assim, a forma como é feito é de uma sensibilidade gigante. O filme mostra, de maneira poética, que podemos nos apaixonar por pessoas reais. Pessoas com defeitos e imperfeitas. Podemos enxergar a pessoa de quem gostamos sob a lente do romantismo. A cena retrata, de maneira elusiva, o momento em que uma pessoa se apaixona por outra. Tem uma certa mágica, mas nem sempre é tão glamouroso.

Entender Duke Ellington não é só saber viver com paixão e estilo. Entender Duke Ellington trata-se de conectar-se ao outro, entender o parceiro, ter sensibilidade e empatia, da mesma forma que a música do mesmo causa esses efeitos e essas sensações. Entender Duke Ellington pode ser uma coisa universal, mas também pode ser muito particular de cada casal. Cada casal tem seu Duke Ellington. Cada casal tem alguma coisa que o conecta e que o aproxima.

Particularmente, para mim, entender Duke Ellington trata-se de desapego. Trata-se de inteligência, de paciência, de companheirismo, de resiliência, de humildade, de alegria e de conseguir enxergar mais do que apenas o seu próprio ponto de vista. Para mim, entender Duke Ellington também significa gostar de Duke Ellington, de fato, e saber apreciar sua música.

domingo, 29 de outubro de 2017

Mudanças de narrativa, ressignificação e autoimagem

"Nada acontece no tratamento psicanalítico além de um intercâmbio de palavras entre o paciente e o analista. As palavras originalmente eram mágicas e até os dias atuais conservaram muito do seu poder mágico. Por meio de palavras, uma pessoa pode tornar outra jubilosamente feliz ou levá-la ao desespero. Palavras suscitam afetos e são, de modo geral, um modo de mútua influência entre os homens."

Nossa memória é seletiva. Dependendo de quem você é e das coisas que acontecem, você acaba lembrando muito mais dos aspectos positivos ou negativos. A forma como contamos as histórias para nós mesmos e para os outros muda completamente a maneira como vemos os fatos e como nos sentimos. Toda mudança de sentimento em relação a coisas e pessoas é acompanhada por uma mudança de narrativa.

"Eu gostava de fulano, mas depois descobri uma coisa que me fez mudar de ideia."
"Eu não gostava de ciclano, mas percebi que ele era diferente do que eu pensava."

Além disso, histórias que contamos sobre nós mesmos quase sempre tendem a proteger nossa autoimagem. Quase ninguém fala algo do tipo "fiz merda porque sou uma pessoa de merda" ou "agi de maneira errada porque realmente não valho nada." O indivíduo que fala esse tipo de coisa é avaliado como alguém que possui uma autoestima reduzida ou que possui problemas de caráter moral. Quase sempre colocamos a culpa sobre nossas decisões ou atitudes ruins em fatores e circunstâncias externas ou que não eram possíveis controlar. No existencialismo, isso é chamado de má fé.

"Agi errado porque estava com raiva."
"Fiz errado porque não me ensinaram."
"Agredi porque me provocaram."

Existe pesquisa que diz que a maioria das pessoas, se perguntada "você se considera uma pessoa mais inteligente que a média?", responde que sim (é chamado de efeito Dunning-Kruger e se aplica a outras áreas também). Essa proteção da autoimagem não é algo errado, é questão de saúde mental. Se uma boa parte das pessoas achasse que possui um valor reduzido, seria um grande problema para elas mesmas. Precisamos recontar nossa própria história quando nos sentimos ameaçados, quando isso nos deixa mal ou para manter uma coerência interna. Precisamos proteger nossa identidade.

Nossa identidade, o que somos e o que pensamos são algumas das coisas mais valiosas que temos. Por isso você vê tanta gente capaz de brigar, discutir e até matar por coisas com as quais se identificam ou contra coisas que ferem sua identidade. É o caso de certas manifestações políticas ou do machão que se descobre corno. E, por isso, algumas pessoas consideram ataques às suas ideias como ataques pessoais.

Prosseguindo, acredito que nossa memória emocional geralmente é mais forte do que a memória dos fatos propriamente dita. Em muitas ocasiões, não lembramos exatamente como aconteceram as coisas, mas podemos nos lembrar de como nos sentimos na hora. Por isso mudar nossa narrativa acaba sendo uma tarefa fácil na maioria dos casos. Não precisamos mudar o que aconteceu, apenas como nos sentimos em relação ao que aconteceu. E, para mudar como nos sentimos, acabamos mudando a narrativa. Acabamos mudando a forma como contamos a história.

Por exemplo, o significado de uma pessoa na sua vida começa a mudar no instante em que a mesma decide terminar um relacionamento amoroso com você. Com isso, muda sua visão sobre ela, mudam as histórias que você conta sobre ela e muda o sentimento que você tem por essas histórias e por essa pessoa. A imagem da pessoa é ressignificada. Você deixa de associar a pessoa ao seu conceito do que é amor. Deixa de associar a pessoa ao seu conceito do que é carinho. Acho isso triste, mas é necessário para que a vida possa seguir.

As narrativas possuem um poder muito forte sobre nossas vidas. A maioria das pessoas não percebe isso. A maioria das pessoas muda as narrativas sem ter consciência. Mudar a narrativa é ressignificar. Ganhar poder sobre suas próprias narrativas significa ter controle sobre sua própria vida. Isso levanta uma série de dúvidas e questionamentos sobre o que é a verdade. Mas deixo essa discussão para um outro momento.

"A memória é uma ilha de edição."


Contém spoilers:

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Ausência

Algumas presenças se tornam ausência
Ausência que se faz presente e é sentida no fundo da alma
É como página rasgada de um livro
Buraco no asfalto do coração
Janela que fica aberta na alma
Quebra-cabeça faltando as peças

Mas não é déjà vu
Por mais que seja igual, é diferente
Tão diferente que parece algo novo
Faz-me sentir como criança
Faz-me sentir inseguro
Faz-me desejar que não aconteça de novo

Flagelo-me para ver se ainda consigo respirar depois que meu coração parar de bater
É questão de tempo, mas não de desejo
Só o que posso dizer é que é real
E, com um sorriso triste de outono, lembro que o futuro acontece independentemente


segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Somos felizes?

"Esse é o problema com a vida, não é? Ou você sabe o que quer e não consegue o que quer, ou você consegue o que quer e então não sabe o que quer."

Somos felizes e não sabemos? Ou somos infelizes e também não sabemos?

Do ponto de vista filosófico, há uma série de perguntas que podemos nos fazer e que servem de indagações para avaliarmos se estamos vivendo uma vida satisfatória. Listo aqui algumas delas:
  • Sua vida é prazerosa? Ou é sofrida?
  • Você age de maneira moral? Você segue princípios?
  • Você se sente uma pessoa livre? Você acha que tem liberdade para escolher o próprio caminho e as coisas que quer?
  • O que você tem hoje em dia e o que você alcançou até o momento são coisas que você já quis algum dia? Já foram seu sonho ou objeto de seu desejo no passado?
  • Você imagina que as coisas que você deseja no momento tem realmente grande impacto sobre sua felicidade? Ou você as está subestimando ou superestimando? O que você quer está muito longe do que você precisa?
  • O lugar em que você se encontra agora (em termos de moradia/trabalho/estudo etc) te alegra ou te entristece? Você acha que está no lugar certo? Você acha que está fazendo aquilo que deveria? Você está fazendo aquilo que gostaria?
  • As pessoas com quem você convive te alegram ou te entristecem? Existe alguém com quem você quer conviver mais? Existe alguém de quem você sente falta? Você sente necessidade de conhecer pessoas novas?
  • Você se dá bem com sua família (pai, mãe, filhos, irmãos, etc)?
  • Você tem algum relacionamento amoroso? Tem alguém que você ame e cujo amor seja recíproco?
  • Se você fosse morrer amanhã ou na semana que vem, o que você faria? O que teria valor para você? Existiria algo de que se arrependeria? Existiria algo que você acha que deixou de fazer?
  • Se você fosse viver a vida que está vivendo agora por repetidas vezes, por mil, dez mil ou infinitas vezes, você iria querer viver esta vida deste jeito, exatamente da forma como tudo ocorreu?
  • Você teria vontade de fazer o que faz ou o que já fez inúmeras vezes? Se fosse continuar fazendo o que você faz hoje em dia para sempre, todos os dias, você continuaria fazendo e se alegraria com isso?
Claro, felicidade é mais que responder simples perguntas. E, para alguns, felicidade nem é a coisa mais importante da vida. Porém, não custa nada se questionar...